Era preciso, era necessário. Talvez até mais que isso, havia ali uma urgência vital. Sua vida havia chegado à um ponto onde um caos psicológico influenciava perigosamente a rotina diaria de todas as coisas.
As explosões de raiva, o fato de ver em todas as mulheres uma possibilidade de sexo, e a impulssividade o estavam atormentando.
Ele que era muitos, e ao mesmo tempo nenhum, estava sofrendo. E o que era pior, fazendo os outros a sua volta sofrerem também.
Como um idiota, que não sabe que é um idiota.
Como um morto, que não sabe que está morto. Um fantasma inconveniente, arrastando correntes por uma casa velha.
Sendo assim, ele decidiu procurar ajuda, por ele, e por quem ele amava. Iniciou uma terapia, contra sua própria vontade. Na sua visão um tanto, ou muito preconceituosa. Fazer terapia era coisa de gente fraca, que não aceitava e entendia os próprios demônios e monstros dentro do armário. Ou simplesmente coisa de maluco mesmo.
A profissional.
Ela era pequena, tinha um rosto bonito, mãos pequenas de um aperto firme, disso ele havia gostado. Ela tinha tornozelos bem bonitos também, uma fina corrente dourada os adornava. Essa criatura de olhos escuros e cabelos pretos seria a detentora dos seus mais obscuros segredos.
A primeira sessão.
Falar doía, e doía muito. Mas ainda assim ele não falava tudo. Dava pequenas amostras, migalhas de um pão amargo que eram a sua vida, a sua psiquê, um quebra-cabeças distorcido com milhares de peças que eram a sua mente. Afinal de contas, ela estaria lidando com as neuroses de mais de um. Não mentiu em nenhum momento, mas omitiu. Talvez pela a segurança dela, ou simplesmente por estar passando por uma nova situação.
Sentiu que não fazia isso só por ele, mas também por quem ele amava. A Fada Branca, que agora era uma Bruxa.
E ele falou também de quase todas as mulheres da sua vida, e de como havia estragado tudo.
A cada sessão ele saía um pouco mais leve, como que se despindo de uma pesada armadura, sentia-se fragilizado. E sentia também que todos os outros dentro dele, pelo menos os mais radicais lutavam contra o que ele estava fazendo. Ele falou de vínculos, os quais não conseguia se desfazer, elos sentimentais dificeis de quebrar, mas que ele sentia que estavam enfraquecendo.
Falou daquele que sempre esteve alí, nas sombras da sua mente observando todos os outros. Dan Dan. O fidalgo, Grão-Duque que decidira controlar todos os outros. Um dândi assustador que mudava de forma, e era todos e um só. Falou, falou e falou, e sentiu-se humilhado por se expôr tanto. Mexeu em feridas que ainda não haviam cicatrizado.
Falou dos "eventos brancos", dos momentos de cólera, mas que fez coisas boas também, seguindo unicamente seu coração.
Mas ainda assim muita coisa precisava ser dita.
Ele não tinha medo.
Medo de perder seus filhos, medo de não estar de acordo com as expectativas deles.
Fora isso, não temia nem Deus e nem o Diabo, não temia homem algum.
Mas tudo isso, eram assunto para as próximas sessões.
FIM
Reverendo Felix Fausto