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segunda-feira, 19 de abril de 2021

Polaca

         A palavra "normal" de forma alguma definiria minha infância. Claro, eu fazia coisas que qualquer criança na minha idade teria feito, brincava, corria, tinha amigos mas não me destacava em nada, gostava de ler, lia muito. Minha tia Jussara havia me ensinado as primeiras noções de escrita e leitura, e a partir daí me alfabetizei quase que sozinho.

   Ela lia muito para mim, lembro que gostava de contar os sofrimentos de Cristo, na sexta feira santa, reunia a criançada, os sobrinhos todos e narrava com dramaticidade e via crucis. Eu de alguma forma me deleitava com aquilo.

   Lembro de ter achado em casa As Mil E Uma Noites, devorei o livro. Depois achei Alice No País Das Maravilhas e na sequência achei A História Universal Da Infâmia, de Jorge Luis Borges. Minha infância dividida entre sombrias leituras e coisas pertinentes a todas as crianças. Nunca entendi se isto foi bom, ou ruím para a minha informação.

   Ela andava sempre com meu tio Dino, ele chamava ela de Polaca, não lembro, ou nunca soube seu nome verdadeiro. Era loira, cabelo dourado, tinha um corpo bonito, pernas perfeitas, que saias mininusculas realçavam a beleza. Eram os anos 70 e minisaias eram um iten indispensável para as mulheres.

    Um dia meu tio me levou a casa dela, deixou-me sozinho com ela, e foi fazer não sei o quê. Eu tinha uns seis anos, fiquei no chão brincando com umas revistas que a Polaca havia me dado. Ela olhava uns discos, e eu ali, sentado no chão descobri as pernas dela. Por um momento esquecí das revistas, perdi meu interesse por elas, fiquei alí hipnotizado por aquelas pernas.

   Ela parecia muito alta, talvez nem fosse, mas do ponto de vista de uma criança sentada no chão ela parecia muito alta.

    Fiquei olhando aquelas colunas de carne, firmes e bem feitas, me aproximei mais para poder ver melhor, conseguia ver por debaixo da saia dela, aquela bunda branca, a calcinha azul. Alheia a minha presença ela continuava olhando as capas dos discos. Não me contive, talvez tivesse a necessidade de saber se aquelas pernas eram reais. Comecei a toca-las com interesse quase religioso, minhas mão alisavam a pele aveludada, foi quando ela olhou para baixo.

-Tu gosta disso né ?- Perguntou sorrindo, eu não entendi nada, mas sabia que estava gostando daquilo. Meu tio entrou e ela disse:

-Olha o quê o danadinho tá fazendo !

   Meu tio sorriu, agora entendo que houve um tipo de aprovação naquele sorriso. Logo ambos sairam e me levaram com eles. Acho que a Polaca foi meu primeiro entendimento do que as mulheres poderiam proporcionar.

   Tarado desde pequeno, e talvez eu nem soubesse.

          FIM


Reverendo Felix Fausto

domingo, 18 de abril de 2021

Domingo Cinza

     Aborrecido eu estava deitado no velho sofá marrom, tendo por companhia a Zarah, cachorra amorosa aninhada entre meus pés não imaginava a causa do meu mal humor.

         Era um domingo cinzento e chuvoso, uns caras jogavam futebol na cancha da praça em frente onde eu morava. Faziam uma algazarra dos infernos.

    Pareciam um bando de chimpanzés, machos gastando testosterona, cada gol era festejado com coreografias ridiculas, abraços, dedos no cu e gritarias.

     Nunca gostei de esportes, nem de praticar, ou assistir. Futebol era complicado para o meu entendimento, corridas automobilisticas mais ainda. Gostava era dos acidentes.

     Preferia exercitar minha masculidade pegando mulher, ou arrumando brigas.

   Mas acho que se jogasse futebol, me incomodaria menos. Futebol me garantiria uma perna quebrada, mulher acaba com o psicológico do cara. Raça complicada.

Complicada demais, um dia desistiria delas.

   Deve existir algo menos danoso para o coração e a cabeça do homem, tinha só que descobrir.

  Mas até achar, meu destino estava nas mãos de relacionamentos e amores complicados.


           FIM


Reverendo Felix Fausto

      

segunda-feira, 5 de abril de 2021

As Vezes Acontece

 As vezes acontece de não se ter uma idéia que o valha. Não sei, ou não tenho maturidade suficiente para lidar com meus bloqueios literários.

    Tanta coisa que eu gostaria de falar e nada acontece, não sai nada. A folha em branco se torna um inimigo invencível, alí me desafiando, virginal e intocável atestando minha mediocridade e impotência.

            Escrevo para não tomar tarja pretas, escrevo para não beber soda cáustica, escrevo para não ter que olhar no espelho, e ver tudo aquilo que não quero.

    Eu só quero escrever, sem a obrigação, ou o fardo de ser genial, escrever de um jeito simples, sem a maldição de ser complexo, que me entendam.

     As vezes acontece e as coisas fluem, e é fácil e as palavras saem, as emoções tinham de ser mais simples, saindo feito escarro, peido, suor, lágrimas, merda e vômito.

    Só as vezes, mas as vezes acontece.


FELIX FAUSTO